Síndrome de Burnout
Nos tempos atuais, em que são altíssimos os níveis de desemprego, e em que é acirrada a concorrência no meio empresarial, somado a uma incessante cobrança pela máxima eficiência no ambiente corporativo, cada vez mais se ouve falar de trabalhadores acometidos de doenças psíquicas e psiquiátricas relacionadas com esgotamento profissional, notadamente daqueles que ocupam cargos de gestão das empresas.
Tais doenças já apresentam caráter endêmico no Brasil e no Mundo, havendo estudos divulgados na imprensa leiga e especializada que dão conta da gravidade e do risco a que são expostos esses profissionais.
Texto do Professor Doutor Gilberto Ururahy, diretor médico da Méd-Rio, publicado em O GLOBO em 18/10/2012, é bastante ilustrativo dessa triste e grave realidade:
“O estresse profissional está disseminado entre os executivos e se constitui numa séria ameaça à saúde das organizações. Profissionais estratégicos das empresas, verdadeiros nômades contemporâneos, são levados, muitas vezes, ao limite da resistência física e emocional. Os níveis intoleráveis de estresse vividos por estes indivíduos os conduzem a um estilo de vida inadequado. É um coquetel nefasto.
Esse estado grave de exaustão física e emocional que pode levar à depressão, e até ao suicídio, é diagnosticado com a síndrome de Burnout (do inglês burn out, cuja tradução seria “queimar por inteiro”). Atinge um em cada quatro trabalhadores europeus. Na França, recentemente, registrou-se uma onda de suicídios em grandes corporações como PSA-Peugeot, Renault, Areva e France Telecom, entre outras. A causa: metas impossíveis x obrigação por resultados. Esta situação coloca o indivíduo face a uma contradição crescente, entre o que lhe é cobrado e o que efetivamente consegue realizar.
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Nesse mesmo ambiente corporativo, onde a cobrança por resultados é cada vez mais intensa, o estresse é a resposta do indivíduo às dificuldades de relacionamento, à pressão permanente pelo cumprimento de metas, aos riscos da tomada de decisões, às exigências dos clientes, à disputa com os concorrentes e mesmo à insegurança de perder o emprego. Como não conseguem conciliar o desempenho profissional com os cuidados com a saúde, sucumbe.
A Harvard Business School já demonstrou que 80% das consultas médicas estão orginariamente ligadas ao estresse. Nessas pesquisas realizadas ao longo de mais de duas décadas e sustentadas em mais de 60 mil check-ups médicos realizados, acusam a presença de doenças incapacitantes, por vezes letais, em indivíduos com idade cada vez mais precoce. Demonstramos isso em palestra no MIT-Cambridge.
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O estresse é endêmico e com incidência crescente entre os executivos. É preciso combatê-lo com programas de prevenção.”
Assim, não é por menos que a Síndrome de Burnout (CID Z73.0) foi inserida no rol dos TRANSTORNOS MENTAIS E DO COMPORTAMENTO RELACIONADOS COM O TRABALHO (Grupo V da CID-10), na Lista B, Anexo II, do Regulamento Geral da Previdência Social.
Cada vez mais se apresentam perante o Poder Judiciário Trabalhista ações envolvendo executivos que adquiriram doenças graves, com o seu total comprometimento para o trabalho, senão por vezes levados à morte, moléstias que não foram consideradas pelo empregador como decorrentes das condições do trabalho, e não receberam a devida proteção jurídica.
Acerca dessa instigante questão, o jovem e brilhante Professor Jorge Cavalcanti Boucinhas Filho dedicou parte de seu estudo acerca da “discriminação por sobrequalificação” (em “Novos Dilemas do Trabalho, do Emprego e do Processo do Trabalho, A Proteção Trabalhista dos Altos Executivos”, Jorge Cavalcanti Boucinhas Filho, Editora LTr, 2012, págs. 69/70), donde se destaca:
“Os executivos, qualquer que seja sua categoria, são, segundo a ideia a ser desenvolvida neste trabalho, uma das figuras mais desprotegidas e mais negligenciadas pelo Direito do Trabalho. Parcela significativa dos operadores do direito do trabalho defende a sua exclusão da proteção trabalhista.
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Analisando com acuidade a relação de emprego dos executivos o que se constata é que tudo o que há de angustiante e desgastante na relação de emprego aumenta na proporção do aumento das responsabilidades e da remuneração. Alguns dos maiores causadores de desgaste emocional e angústias em uma relação de emprego são: 1) a instabilidade no emprego; 2) o temor do desemprego; 3) o excesso de trabalho e a falta de período de descanso e repousos adequados; 4) a pressão e o estresse relacionados com a necessidade de cumprimento de metas, por vezes inalcançáveis. Se estes fatores são ruins para os trabalhadores de menor hierarquia são seguramente muito piores para os altos executivos.
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Quanto ao terceiro ponto é forçoso reconhecer que a jornada de trabalho dos altos executivos encontra-se entre as mais extenuantes e seus períodos de descanso entre os mais sofridos. Eles não têm controle algum de jornada, são verdadeiros escravos de seus smartphones, os grilhões dos novos tempos. Acessam seus e-mails e mensagens o tempo todo e a todo tempo, inclusive em seus períodos de descanso. Mesmo quando distantes da empresa, para desfrutar férias, por exemplo, precisam manter contato constante com seu substituto para que nada de inesperado venha a ocorrer. Precisam estar prestes a interromper ou a cancelar seu descanso, caso percebam que o seu afastamento naquele momento poderá interferir nos resultados da empresa. Se não o fizerem, correrão o risco de ser responsabilizados por haver escolhidos gozar suas férias em momento inadequado.”
Por tudo isso, é muito importante que os operadores do direito estejam atentos e preparados para enfrentar essa questão perante os Tribunais, não apenas com vistas à devida reparação da vítima da Síndrome do Esgotamento Profissional, mas, sobretudo, para o fundamental caráter educativo e dissuasório que terão as indenizações.

