Justiça do Trabalho nega quitação ampla e irrestrita em homologação de transação extrajudicial

Publicado no site do TRTMG em 08/02/2021 • 19 de fevereiro de 2021

Transação extrajudicial.  Quitação geral não homologada pela Justiça do Trabalho.

Ao homologar transação extrajudicial, realizada entre empresa de transportes urbanos e um ex-empregado, o juiz Leonardo Tibo Barbosa Lima, que atuou na 1ª Vara do Trabalho de Formiga, negou a pretensão das partes de que a homologação da transação extrajudicial levasse à quitação “pela extinção do contrato de trabalho”, de forma ampla e irrestrita. Pretensão que, nas palavras do juiz, “não encontra amparo jurídico”. O magistrado homologou a transação, porém, estabeleceu as seguintes restrições:

1) conferiu interpretação restritiva da extensão da quitação;

2) conferiu quitação restrita às parcelas expressamente contidas no acordo;

3) ressalvou a interrupção da prescrição apenas em relação às parcelas expressamente consignadas;

4) ressalvou o direito das partes de pleitear quaisquer parcelas não abrangidas pelo acordo.

“Homologar, pois, uma cláusula de quitação geral e irrestrita sem conhecer a fundo os fatos, em um procedimento de jurisdição voluntária, é fortemente temerário e não condiz com a responsabilidade que se exige de um magistrado do trabalho, data venia aos entendimentos em contrário”, destacou o magistrado.

Transação extrajudicial - Requisitos formais - Na sentença, o juiz considerou preenchidos os requisitos formais da ação de homologação da transação extrajudicial, como previsto no artigo 855-B da CLT, tendo em vista que os interessados se apresentam por meio de petição conjunta e devidamente representados por advogados distintos. Além disso, o acordo não envolveu terceiros e nem relação jurídica estranha à competência trabalhista, o que, segundo o juiz, só seria possível em processo de jurisdição contenciosa, nos termos do artigo 515, II e parágrafo 2º, do CPC, e não de jurisdição voluntária, como é o caso da ação de homologação de acordo extrajudicial. Quanto ao conteúdo, explicou tratar-se de direitos cuja expressão econômica é disponível, não havendo, portanto, renúncia de direitos.

Espécie de quitação – Entretanto, a pretensão das partes de que a homologação da transação extrajudicial levasse à quitação “pela extinção do contrato de trabalho”, com quitação ampla e irrestrita, não foi aceita pelo magistrado, porque, nas palavras dele, “não encontra amparo jurídico”.

Ao fundamentar sua decisão, o julgador lembrou que o artigo 855-E da CLT dispõe que a prescrição só fica suspensa em relação às parcelas expressamente especificadas na petição de acordo, o que torna claro que as partes devem discriminar todas as parcelas e somente quanto ao valor delas haverá quitação, sem prejuízo de ajuizamento de ação de cobrança de diferenças ou de outras parcelas não contempladas no acordo.

Nesse contexto, o juiz também fez referência ao artigo 843 do Código Civil, que impõe a interpretação restritiva das transações, de maneira que elas não podem abranger parcelas que não façam parte do acordo.

“Não se está afastando a validade da espécie de quitação escrita na petição de acordo, a qual permanece válida e até eficaz na relação material de trabalho, com a mesma força de qualquer documento privado. Mas, na relação processual, a eficácia da quitação, para fins de homologação, deve ficar restrita ao que a lei permite ao juízo fazer”, destacou Barbosa Lima.

Além disso, o juiz ponderou que a questão deve ser considerada sob a perspectiva do Juízo: “Em uma demanda (ação trabalhista), as partes se apresentam com interesses opostos e isso facilita ao Juízo conhecer os fatos. Todavia, no caso do acordo extrajudicial, não há demanda e, considerando que o Juízo não possui poderes investigatórios, ele fica à mercê dos requerentes, os quais apresentam um documento pronto e acabado que pode muito bem ocultar uma simulação da espécie mais lesiva, que é a que visa prejudicar terceiros, como ocorre na dilapidação de patrimônio, no saque indevido de FGTS e no recebimento ilícito do seguro-desemprego, por exemplo”. Geralmente, em situações assim, completou o magistrado, de nada adiantaria interrogar interessados, porque eles já se apresentam com interesses convergentes, o que torna muito grande o risco de o Juízo ser induzido a chancelar uma simulação.

O juiz lembrou que, antes do advento do novo artigo 855-B da CLT (acrescido pela reforma trabalhista e que dispõe sobre o processo de homologação de acordo extrajudicial), a cláusula de extinção do contrato de trabalho, com quitação ampla e irrestrita, jamais foi um direito líquido e certo das partes, tendo em vista que o Juízo nunca foi obrigado a homologá-la. “É dizer, na dúvida quanto aos reais interesses das partes, era comum que a quitação fosse homologada apenas considerando o objeto do pedido”, frisou. E, para o julgador, a Lei nº 13.467/17 não alterou essa situação.

É que, segundo Barbosa Lima, o interesse do empregador de obter uma garantia absoluta de não ser demandado por seu empregado só encontra amparo no Estado Democrático de Direito por meio do instituto da prescrição (artigo 7º, XXIX, da CF). “Fora da prescrição, em nenhuma relação jurídica (civil, administrativa, tributária, consumerista etc…) o devedor possui prerrogativa de impedir o direito de ação de seus credores, porque esse direito tem natureza fundamental (artigo 5º, XXXV, CF)”, pontuou.

Na avaliação do julgador, a cláusula de quitação pelo extinto contrato de trabalho é, portanto, um costume trabalhista que tem que ser interpretada de forma sempre restritiva, do contrário, poderá haver cerceio de direito fundamental por meio de um artifício meramente formal e simplório.

“Reforça esse entendimento o princípio da proteção do trabalhador (artigo 7º da CF), o qual é a pedra de toque de todo o Direito do Trabalho, por mais que isso desagrade e incomode a quem quer que seja”, enfatizou o magistrado, que homologou a transação extrajudicial nos termos apresentados, mas sem conferir a quitação ampla e irrestrita quanto aos direitos oriundos do contrato de trabalho, negando a pretensão das partes, nesse aspecto. Em grau de recurso, a Oitava Turma do TRT mineiro manteve a sentença.

Processo

  •  PJe: 0010453-70.2020.5.03.0058 (HTE)


Por HELENA JACOB BOIM 23 de agosto de 2024
No Brasil, a legalidade das casas de bingo é um tema controverso e historicamente marcado por idas e vindas na legislação. Na década de 1990, bingos e outras formas de jogo eram permitidos, com a regulamentação dada pela Lei Zico (Lei nº 8.672/1993) e posteriormente pela Lei Pelé (Lei nº 9.615/1998). No entanto, em 2004, com o Decreto nº 9.981/2004, foi suspensa a exploração deste ramo em todo o território nacional, sob a alegação de que estas atividades contribuíam para a lavagem de dinheiro, sendo então considerada atividade ilícita, com enquadramento penal, segundo o art. 50 da Lei das Contravenções Penais. Desde então, a exploração de bingos permaneceu proibida no Brasil, apesar de algumas iniciativas legislativas tentaram regularizar novamente essa atividade. Sem sucesso até o momento, o debate continua em alta, especialmente com o avanço de plataformas de apostas online. É nesse sentido que, em recente decisão, a Justiça do Trabalho, por meio da 12ª Turma do TRT da 2ª Região, negou provimento a recurso de funcionária de casa de bingo que buscava o reconhecimento de vínculo empregatício e pagamento de verbas trabalhistas, concluindo pela nulidade do contrato de trabalho, uma vez que a atividade desempenhada se deu em contexto ilícito. A funcionária alegou que foi contratada por uma sociedade beneficente para atuar no manejo de cartelas de jogo em duas unidades localizadas na capital paulista, sem registro formal. Além do reconhecimento de vínculo de emprego, ela buscava o pagamento de horas extras, adicionais noturnos, diferenças salariais, entre outras verbas rescisórias. A entidade filantrópica, na contrapartida, alegou nunca ter contado com os serviços da trabalhadora nem ter tido envolvimento com o bingo, versão confirmada por prova testemunhal, não tendo sido possível demonstrar a natureza beneficente da atividade, o que legitimaria, em tese, sua atuação. Segundo o desembargador-relator do acórdão, Doutor Jorge Eduardo Assad, é preciso se atentar a distinção entre trabalho ilícito e proibido. Conforme consta do acórdão: "(...) o primeiro diz respeito àquele cuja ilicitude está presente em seu objeto, ou seja, a própria atividade enquadra-se em um tipo legal penal ou concorre para ele, a exemplo do tráfico de drogas, e jogos de azar não autorizados por lei como os bingos e o chamado "jogo do bicho" (OJ nº 199 da SBDI-1 do C. TST); o segundo, não obstante o desrespeito a norma proibitiva, se refere a restrições decorrentes da condição específica do empregado e não propriamente da atividade exercida, ou seja, o trabalho é lícito, porém, em determinada circunstância, é vedado a fim de resguardar o próprio trabalhador ou o interesse público, como nos casos do trabalho noturno, perigoso ou insalubre do menor." A exploração de bingos apenas não será considerada ilícita se houver autorização específica das autoridades competentes, conforme disposto no art. 4º da Lei nº 5.768/71. Como o serviço realizado pela autora estava diretamente ligado a atividade considerada ilícita, o contrato de trabalho foi considerado nulo, sem gerar efeitos jurídicos, conforme consta da Ementa: "PARTICIPAÇÃO DO EMPREGADO NA ATIVIDADE ILÍCITA. BINGO. OBJETO ILÍCITO. CONTRATO NULO. Comprovada que a atividade desempenhada pela reclamante estava ligada à atividade ilícita desenvolvida pela reclamada - casa de bingo, deve ser reconhecida a nulidade do contrato por ausência de objeto lícito, o que torna sem efeito o pacto celebrado entre as partes. Recurso não provido." Além dos requisitos da subordinação, pessoalidade, onerosidade e habitualidade, previstos na CLT, a relação de emprego deve obedecer aos elementos essenciais do contrato. De acordo com o art. 10 do Código Civil, a validade é condicionada à capacidade das partes, à licitude do objeto e à forma prescrita ou não vedada em lei. Assim, diante da ilicitude do objeto do contrato de trabalho, o reconhecimento do contrato de trabalho foi declarado improcedente, bem assim todos os demais pedidos a esse reconhecimento correlatos.
Por HELENA JACOB BOIM 8 de agosto de 2024
Justiça do Trabalho determina a retenção de passaportes de devedores contumazes
Por HEITOR CORNACCHIONI 12 de junho de 2024
MUITA ATENÇÃO ! CUIDADO COM GOLPES VIA WHATSAPP !
Por HEITOR CORNACCHIONI 14 de julho de 2022
APLICAÇÃO DO DIREITO NO TEMPO ALTERAÇÕES NO DIREITO MATERIAL NÃO ATINGEM CONTRATOS DE TRABALHO VIGENTES. DIREITO ADQUIRIDO e NÃO RETROCESSO SOCIAL
Por HEITOR CORNACCHIONI 14 de julho de 2022
A INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO LEVADA A EFEITO PELO TST
Por HEITOR CORNACCHIONI 4 de janeiro de 2022
Nem tão insignificante assim.
Por HEITOR CORNACCHIONI 31 de dezembro de 2021
Em bom tempo a LGPD veio para salvaguardar os dados pessoais dos candidatos envolvidos em processos seletivos. A questão já vinha sendo tratada há algum tempo no Poder Judiciário, notadamente em ações civis públicas promovidas pelo Ministério Público do Trabalho. Com a chegada da LGPD, parecer estar definitivamente solucionado o controvertido uso de dados pessoais em processos seletivos. E a Justiça do Trabalho dela tem se valido para impedir o compartilhamento desses dados. No caso em análise, o Tribunal Superior do Trabalho, por sua Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, valeu-se da LGPD para garantir a inviolabilidade dos dados da vida privada dos candidatos.
Por HEITOR CORNACCHIONI 29 de dezembro de 2021
A CONTROVERTIDA QUESTÃO DAS VIAGENS A TRABALHO, NA VISÃO DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO.
Por HEITOR CORNACCHIONI 28 de julho de 2021
O TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO RECONHECEU ABUSIVIDADE NA CONDUTA DO EMPREGADOR QUE IMPÕE RESTRIÇÕES ÀS PAUSAS NO TRABALHO PARA USO DO BANHEIRO, MEDIANTE PROGRAMA DE INCENTIVO À PRODUTIVODADE QUE IMPÕE PERDAS SALARIAIS.
Por HEITOR CORNACCHIONI 3 de maio de 2021
Publicado no Clipping da AASP em 03/05/2021
Mais posts